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Neusa Cidade Garcez

Alguém me socorre?? Quem??? Ninguém!!!!

Desde sempre me senti fora do tempo. Meus gostos e predileções eram diferentes de amigas da minha idade. Estudar e ler me encantavam, embora nunca tivesse tido grande quantidade de livros. A história me fascinava apesar de que uma professora no primeiro grau só nos mandasse fazer questionários, nunca explicasse nada e sempre me repreendesse por minhas respostas longas demais. Meu sonho era visitar museus e viajar, o que me parecia impossível então. As civilizações passadas me intrigavam e me levavam muitas vezes a visitar a única biblioteca existente em Erechim e que ficava bem longe para as minhas frágeis perninhas que nem dispunham de ônibus – se é que existiam na época. Na caixa de fotografias de meus pais, eu espiava com reverência fotos de antepassados e extraia delas, incríveis histórias contadas só na minha imaginação.

Talvez eu já tenha nascido idosa pois tudo o que era passado era tratado com respeito, e alguns objetos eram guardados como lembranças preciosas.

O tempo passava e minha consciência valorativa se aprimorava.

Admirava o casario de minha cidade natal, suas igrejas e capitéis, sua bela e larga avenida central. O traçado diferenciado e famoso dado à cidade por Torres Gonçalves me enchia de orgulho. Escrevia e participava de ações preservacionistas de nosso patrimônio Histórico. Levada e incentivada por Vanda, Rosely, Maríndia, Fiori e Albano Wolkmer, em inúmeras ocasiões abraçamos o Castelinho, objetivando salvá-lo da ruina e preservá-lo como um síbolo forte que representa para a história regional.

Com a Estação Férrea, encetamos labuta parecida, em várias ocasiões. Na maioria, nossas batalhas sofriam derrotas ocasionadas por interesses outros que não os culturais.

Mas eis que eu, que tanto apreciava unidades arquitetônicas antigas, fui residir em um dos marcos do colonizador: a casa primeira escola do Profº Mantovani.

Por quase duas décadas meu pai manteve a vetusta construção em pé com seu esforço e cuidados de carpinteiro milagroso.

Havia em nossa família, em primeiro lugar a necessidade econômica de ali residir. Porém, com o passar do tempo um carinho e um respeito profundo por todas as vivências, emoções boas e menos boas ali sentidas e ainda latentes, foram sendo plasmadas em nós, que passamos a ver a pequena construção como algo digno de preservação.

Após trocarmos de residência, semanalmente, eu ia espiar “nossa casa”, almejando que fosse restaurada. Em nossos grupos de estudo, ou no Conselho de Políticas Culturais, o assunto vinha a baila. Sempre acreditei que a histórica casa deveria ser recolocada no terreno da Escola Profº Mantovani, como foi a Casa do Pastor em Rio Novo, ação da qual participei, em parte, salvando-a, quando do fechamento da barragem Itá, Aratiba.

A cada nova olhada semanal na casa, fico mais e mais atônita e revoltada. A vegetação tomou conta das paredes, sua sacada, que chamávamos de corredor e onde meus pais chimarreavam nas tardes, despencou. O belo lambrequim que eu tentei salvar das chuvas, mandando fazer uma calha de ótimo material, que me custou boa parte de meu pequeno salário de então, está todo corroído pelos cupins, assim como está toda a construção.

Não consigo aceitar a falta de sensibilidade e de cultura das pessoas que poderiam salgaguardar o pouco que nos resta do patrimônio construído pelos que verdadeiramente foram os grandes e fortes atores do progresso que hoje desfrutamos.

Pedir socorro de nada mais vale. A casa começada a construir entre 1915-16 e concluída em 1917 e onde um homem idealista começou uma primeira escola, exala, como um animal ferido e abandonado, seu último alento.

Para nossa vergonha e ignorância!

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